A entrevista concedida por Divaldo Pereira Franco para o Jornal do Commercio e de grande valia para todos nós espíritas, principalmente pela profundidade de suas respostas, diante de boas perguntas da atualidade.
Aproveitem e passem adiante.
Maior médium em atividade do Brasil concedeu exclusiva ao Jornal do Commercio
Médium tem 685 filhos adotivos
Flora Pimentel/JC Imagem
Nunca temas espíritas ou espiritualistas ocuparam tanto espaço nos meios de comunicação como agora. Há filmes, novelas, programas e até canais de TV por assinatura que exploram o intercâmbio do mundo físico com o espiritual. Aos 85 anos, o educador baiano Divaldo Pereira Franco é um grande divulgador dos postulados espíritas. Com 232 livros publicados, 95 deles em 16 idiomas – alguns em braille –, e mais de 10 milhões de exemplares vendidos, Divaldo é considerado o maior médium em atividade no Brasil depois da morte do mineiro Chico Xavier, em 2002. Para divulgar a doutrina codificada por Allan Kardec, que professa desde a juventude, ele já viajou por 64 países de cinco continentes. “Vivo no check in”, comenta, bem-humorado, revelando que passa cerca de 230 dias por ano no exterior. Também comanda uma obra social grandiosa, iniciada em 1955. A Mansão do Caminho, no bairro de Pau da Lima, em Salvador, é mantida com os recursos da venda dos livros psicografados (recebidos por inspiração dos espíritos). Ela oferece abrigo e educação a 3.190 crianças desde o nascimento – há um centro de parto natural na entidade – até os 17 anos, quando saem com uma profissão definida. Divaldo tem 685 filhos adotivos, que já deram a ele mais de 200 netos e bisnetos. Durante passagem pelo Recife para participar do 7º Simpósio de Estudos e Práticas Espíritas, no fim de semana passado, Divaldo Franco concedeu entrevista ao Jornal do Commercio e falou sobre sua mediunidade, as mudanças esperadas para esse novo milênio e o futuro do Brasil. “Já vi o mundo acabar três vezes nesses meus 85 anos. Mas o que vai acabar mesmo é o mundo moral inferior, através de um tsunami espiritual, quando despertarmos para a vida do espírito”, afirma.
JORNAL DO COMMERCIO – Hoje proliferam-se filmes, novelas, programas abordando temas como imortalidade, mediunidade e reencarnação. Como o senhor vê esse “boom” do espiritismo na mídia?
DIVALDO PEREIRA FRANCO – Considerando-se a profundidade dos conceitos espíritas, era de se esperar que, a qualquer momento, a grande mídia fosse convidada a divulgar seus postulados. Tendo seus paradigmas confirmados por investigação científica, o espiritismo saiu dos laboratórios de pesquisa para uma proposta filosófica. Vivemos momentos de grandes desafios. Todos temos muitas perguntas. O espiritismo tem as respostas. Fundamentando seu comportamento na ética do evangelho de Jesus, é profundamente consolador. Especialmente porque conseguiu matar a morte, demonstrando que o aniquilamento convencional, adotado pelo materialismo, não tem fundamento na própria investigação paranormal. Então, consideramos muito positivo esse imenso “boom” na imprensa, em seus variados órgãos de divulgação. Aquilo que muitas vezes é apresentado de forma incorreta não chega a prejudicar porque, de qualquer maneira, chama a atenção para a ideia em si. Tornando essa ideia popular, fica mais fácil explicar sua legitimidade do que quando combatida tenazmente, como ocorria no passado.
JC – O espiritismo afirma que a Terra vai se transformar em um planeta de regeneração, superando a fase dolorosa das expiações. Mas como acreditar nessa previsão diante de tanta violência e corrupção?
DIVALDO – Sempre houve todos esses problemas no mundo, mas eram acobertados. Havia muita preocupação em ocultar o crime, desvios sexuais, vícios, apresentando uma postura falsa de pureza, quando era apenas puritanismo. Graças à imprensa, hoje facilmente derrubam-se as máscaras e apresentam-se os indivíduos conforme são, o que é muito positivo. De alguma forma, ao desmascarar-se o crime, apresentam-se propostas para uma conduta correta. Naturalmente que a grande renovação virá pouco a pouco. Não será em um passe de mágica porque depois de quase 10 mil anos de cultura, civilização e ética dentro de padrões que não correspondem à realidade, mais aparência que legitimidade, a operação transformadora é lenta. Porém, fixando suas raízes nos alicerces do comportamento humano e contando-se com a tese da reencarnação, os espíritos viciosos e perversos não se reencarnarão na Terra, vindo uma nova geração de espíritos nobres que, com muita facilidade, instalarão o bem. Por outro lado, há um certo masoquismo quase sadista, de se acompanhar as tragédias, as calamidades. Nunca houve tanto bem praticado no mundo (como agora) e tão pouco divulgado. Há pouco, acompanhamos um grupo de médicos que dedica um largo espaço de tempo a fazer cirurgia corretiva de lábio leporino sem cobrar. Eles já vêm trabalhando há muitos anos, mas eu ignorava completamente por falta de divulgação. Lentamente o bem vai entrando nas grandes empresas da mídia e sendo apresentado, causando imensa surpresa quando, em verdade, está predominando em nosso organismo social.
JC – Nas suas palestras, o senhor faz um grande apanhado histórico, citando fatos em ordem cronológica e personagens pouco conhecidos. O senhor estuda muito ou esse conhecimento vem da espiritualidade, por inspiração?
DIVALDO – Estudar é impossível, pois não tenho tempo. Somente os e-mails me tomam duas horas diárias. As viagens são ininterruptas. A administração de nossa instituição, que atende a mais de cinco mil pessoas por dia, também me toma um tempo imenso e as psicografias consomem, em média, quatro horas diárias. Toda base original é inspirada. Naturalmente, face à minha idade avançada e à minha experiência, eu guardo muitas informações. Cada palestra me enriquece pelo que chega do mundo espiritual. E vai adicionando aos conhecimentos que vou armazenando ao longo do tempo. Então, há um misto de inspiração que coordena e traz dados novos e o conhecimento anterior, resultado da própria experiência.
JC – O processo de psicografia é mecânico? A informação passa por sua mente ou o texto vai direto para o papel?
DIVALDO – Vai direto para o papel. Às vezes chega suavemente a ideia. Eu me coloco à disposição, os espíritos tomam o braço, eu vou escrevendo, tendo a ideia do que estou escrevendo. Quando se trata de romance mediúnico, tenho a visão psíquica do que estou descrevendo (o fato). Mas na maioria das vezes é automático.
JC – O século 19 foi marcado por grandes médiuns, como a italiana Eusápia Palladino (testada pelo cientista italiano Cesare Lombroso) e o escocês Daniel Douglas Home, que possuíam muitas aptidões, como o senhor e Chico Xavier. Mas eles estão escasseando. Isso faz parte desse processo de evolução?
DIVALDO – O fenômeno foi para chamar atenção. Depois de confirmada a sua legitimidade, agora o que interessa é o comportamento humano. Provada a imortalidade da alma, não temos alternativa senão comportarmo-nos como aqueles que acreditam que a vida continua. A fenomenologia continuará, porém menos ostensiva.
JC – Então, a grande finalidade das manifestações era comprovar a imortalidade da alma?
DIVALDO – O objetivo essencial era chamar atenção, depois delinear objetivos filosóficos e morais e, por fim, convidar o indivíduo à prática do cristianismo puro, conforme Jesus e seus apóstolos viveram.
JC – Que experiência psíquica foi o divisor de águas na sua seara espiritual?
DIVALDO – Foi uma experiência curiosa, de natureza anímica (não mediúnica). Eu tive um sonho no qual eu me sentia desdobrado (fora do corpo) e via uma formação de nuvens que, no perfil, fazia lembrar a face de Cristo. Eu estava acompanhado de Nilson de Souza, um velho amigo, e fui tomado de espanto. Quando olhei a uma regular distância, vi uma figura muito especial. A roupa era pesada, de tecido grotesco, a cabeleira abundante sobre os ombros. Eu pensei: meu Deus, é Jesus! Então, ouvi uma voz muito nobre perguntar: “Tu me amas?”. Lembrei que Jesus perguntou isso a Pedro e respondi: “Sim, eu o amo”. “Então”, respondeu ele, “perdoa todos aqueles que te magoaram”. Eu passei pela mente e não lembrei de alguém que me tivesse ofendido. Então ele perguntou pela segunda vez: “Tu me amas?”. Eu disse: “Senhor, eu o amo”. “Então, perdoa todos os que te ofendem (no presente).” Aí eu fiquei muito preocupado, porque nunca dei muita importância a essas querelas. E ele perguntou pela terceira vez: “Tu me amas?”. Eu respondi: “Daria minha vida pelo Senhor”. “Então, perdoa todos aqueles que te ofenderem (no futuro).” Eu tinha 20 anos e isso marcou muito minha vida. Eu sei que não foi Cristo. Foi uma projeção que chamamos de ideoplastia. Mas serviu de roteiro para nunca me magoar, nunca me aborrecer, nem guardar ressentimento. Foi um roteiro de vida muito bom, porque me deu estabilidade emocional até hoje, permitindo que eu tenha uma vida serena na medida do possível.
JC – E sua mentora e principal autora dos seus livros, Joana de Angelis, ela tem planos de retornar à Terra?
DIVALDO – Ela sempre diz que voltará quando eu terminar minha tarefa física.
JC – E o guia de Chico Xavier, Emmanuel?
DIVALDO – Chico Xavier anunciou no ano 2000 que participou do momento em que Emmanuel renascia. Acredito que ele (Emmanuel) está reencarnado, com 10 ou 11 anos, hoje, no interior de São Paulo.
JC – Um livro psicografado por Chico Xavier, de autoria de Humberto de Campos, apresenta o Brasil como coração do mundo e pátria do evangelho. Como acreditar nessa denominação diante de tanta corrupção? Será que o País vai engrenar e crescer do ponto de vista educacional?
DIVALDO – Não só nosso País como o mundo. Nós vamos ver. Ocorre que essa é uma imagem figurativa de Humberto de Campos, porque Deus não tem Canaãs, não tem Israels. Não tem países privilegiados. Na sua condição de literato brasileiro muito respeitado, ele concebe, literariamente, que o Brasil tem a forma de um coração. Uma forma aparente. Quando ele fala de coração do mundo é porque o brasileiro, genericamente, não é belicoso, não temos tido movimentos revolucionários sangrentos como tantos países da América Latina e do mundo. Então, nesse sentido de afetividade, pela miscigenação das raças, o brasileiro é realmente gentil, otimista, contenta-se com pouco, é afável. É a pátria do evangelho porque aqui a doutrina espírita expande-se. É o país mais espírita do mundo e tem exportado a doutrina. É nesse sentido alegórico que o Brasil é o coração do mundo. Mas chegará o dia em que o mundo todo será a grande Canaã, a terra da promissão.
JC – Ficou um vácuo depois da partida de Chico Xavier? Há substituto para ele?
DIVALDO – O espiritismo não tem transmissão de cargo nem por hereditariedade, nem por eleição. Cada um traz uma tarefa que, ao concluir, encerra um ciclo. A ausência de Chico Xavier do corpo físico é sentida na afetividade, na experiência nobre do grande missionário. Mas Jesus saiu da Terra, do corpo físico e o trabalho continuou. Allan Kardec, que era mais importante que Chico, desencarnou e o trabalho prosseguiu. O mundo espiritual programa equipes. Quando alguém parte, deixando a tarefa concluída, novos caminhos abrem-se, porque aquele ciclo realizou seu périplo e encerrou.
JC – E do seu ciclo, a gente ainda pode esperar muito?
DIVALDO – Estou no crepúsculo, considerando minha idade avançada. Mas estou muito bem e espero ainda ter oportunidade de prosseguir por algum tempo, fazendo o melhor que estiver a meu alcance. A minha disposição é trabalhar sem cessar, aproveitar sempre o tempo como foi desde a juventude.
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